domingo, 5 de junho de 2011

Xirê na Lagoa da Pampulha?


Lu - O acontecimento que vamos relatar aqui, aconteceu conosco há quase três anos, quando eu cursava uma pós-graduação na PUC em Estudos Africanos e Afro-brasileiros. O curso claro, era voltado para os costumes afro-brasileiros. E os amigos leitores que me conhecem, sempre tive o hábito perguntar muito, tirar dúvidas, questionar. Na época aproximavam-se os festejos de 8 de dezembro, Festa de N.S. da Conceição, no sincretismo, Iemanjá.

Lu - Nunca fui perita no assunto religiosidade afro-brasileira, mas morando tantos anos no Rio, conhecia o básico pra pelo menos entender o que estava rolando no Reveillon. Então minha língua coçou, não consegui resistir, tive que perguntar:
__ Professora, Minas não tem mar, essa festa vai ser onde?
__ Na Lagoa da Pampulha! É a coisa mais linda...

Lu - Daí me veio a mente, “se é a coisa mais linda não sei, mas alguém me explica o que Iemanjá tem haver com a Lagoa da Pampulha? Ela é uma lagoa artificial!” Tive que falar:
__ Iemanjá na Lagoa? Lagoa é água doce e a água doce é de Oxum... - Na verdade Oxum estaria num ambiente de água corrente. Estava achando o cúmulo dos cúmulos.

Lu - Quando a professora perguntou quem tinha interesse em participar da festa, eu logo levantei a mão. Não podia perder uma festa pra Rainha do Mar, numa lagoa artificial. Pense comigo: “coisas que só acontecem em minas...”

Lu - Passados alguns dias fomos para a festa que seria num sábado. Fomos de carro: na direção a profa. Íris, ao seu lado o João – que foi o primeiro da turma a fazer a passagem, e temos muitas saudades dele - , atrás Jaqueline, Mauro – convidado especial – e eu. 
 
Mau - Convidado especial?!? Bota especial nisso. Eu não sabia o que esperar do evento. Toda aquela coisa de Iemanjá era nova pra mim. Pra vocês terem uma idéia, nunca vi como era a festa no Reveillon. Mas estava acompanhando a Lú, então tava tudo beleza.

Lú - O tempo não estava essas maravilhas, a tarde caindo, mas mesmo assim fomos para a Lagoa, pois tínhamos a confirmação de que haveria a festa. Eu pensando no absurdo e a Jaque imaginando que lindo seria. E no céu os primeiros raios. A Jaque começou a vibrar. Iansã vem também. Eu ainda zombava quando a chuva começou a cair.

Lú - Sabe a expressão “fração de segundos?” foi o tempo aproximado que levou entre a gota d'água no visor do carro e o caos total. Quando passamos pelo Mineirão não chovia, quando viramos na Lagoa presenciamos o que eu nunca havia visto. A Íris cautelosa guiava o carro e procurava o tal palco. As ondas vinham em nossa direção. Ondas? Sim dava pra surfar na Lagoa da Pampulha. Nossa professora apontou em uma direção e disse:
__ É ali que fica costuma ficar o palco! - Tudo se apagou. Tudo se acendeu. Ela tentou indicar de novo: __ Ali, próximo da estátua de Iemanjá, bem ali... - Tudo se apagou e não vimos nada, só raio cortando o céu.

Mau - Mermão, a parada ficou sinistra. Nós dentro do carro, chuva, trovão, relâmpago e nada de Iemanjá...

Lú - Jaqueline, a mais empolgada do grupo logo disse é Exu brincando com a gente. E as ondas iam e vinham de dentro da Lagoa. Vento forte, trovões e raios cortando o céu, galhos de árvores caindo... Foi quando a Íris resolveu voltar, não havia mais visibilidade. Jaqueline toda feliz dizendo:
__ Viu todos os orixás estão aqui!

Lú - Com muito esforço o carro voltou e quando passamos novamente por aquele ponto onde ficava a estátua de Iemanjá, todas as luzes se apagaram. Estávamos a ponto de sermos levados pelas ondas quando conseguimos sair da orla.

Mau - Fiquei quieto pensando sobre a chuva, como iríamos voltar pra casa e naquele evento que deveria ter sido sabotado por São Pedro...

Lú - Desculpem-me a mistura de egrégoras. São Pedro é da mitologia cristã, estamos falando de mitologia afro-braileira... 

Lú - Nos dias que se seguiram, não sabia muito bem o que pensar. Mas aprendi a lição. Iemanjá pode se manifestar na Lagoa, o que conta é a fé. Nunca mais cheguei num ambiente de Umbanda ou Candomblé sem saudar Exu, nem duvidei das forças da natureza, nem em Minas ou em qualquer outro lugar onde eu esteja. Creio que a partir de então é que tenha surgido minha paixão pela religiosidade afro-brasileira, a qual dedico meus estudos... E a Jaqueline estava certa, aquela foi a festa, um verdadeiro xirê, no qual os orixás foram anfitriões!

2 comentários:

  1. hehehe
    Adorei... estou fazendo um curso de Contribuição Afro para a Cultura Brasileira, Falam muito sobre isso nas aulas...

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  2. Que bom alguém que comprova o espetáculo da natureza vivenciado por nós. Onde vc tá fazendo esse curso? Quero escrever sobre esse assunto na minha monografia...

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